sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Liberdade Provisória Menor

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUIZA DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE SANTO ANDRÉ – SP









Processo n° XXXXXXXXXX



XXXXXXXXXXXXXXX, menor já devidamente qualificado nos autos do processo em epigrafe, por sua advogada que a esta subscreve, nomeada nos termos do convênio da Procuradoria Geral do Estado e da OAB/SP, conforme ofício nº XXXXXXXXX, vem, respeitosamente a presença de Vossa Excelência, expor e requerer o que segue:

Tendo em vista a Vossa decisão de fls., a qual decretou a internação provisória do menor até a data da audiência em 30 de abril do ano em curso, vem esta subscritora requerer a reconsideração de tal mediada decretando a desinternação do menor Washington, com fundamento nos fatos abaixo:


1) DOS ANTECEDENTES DO MENOR

Como poderá ser avaliado por Vossa Excelência, nos documentos ora anexados, o menor encontra-se regularmente matriculado em instituição de ensino, junto à Escola Estadual Prefeito Engenheiro Celso Augusto Daniel, cursando a 1ª série do Ensino Médio.

Desempenha o menor atividade esportiva, junto ao Centro de Treinamento, os quais declararam que o mesmo não tem nada que desabone sua conduta, bem como tratar-se de atleta exemplar.

Ressaltamos ainda que o menor iniciaria atividade profissional junto a Recuperadora de Carcaças ABC, atuando na área de auxiliar de manutenção, na data de XX de março, o qual foi impedido por estar internado.

Seus familiares em atitude de desespero pelo ocorrido e cientes da boa conduta e caráter do menor solicitou junto à amigos e conhecidos assinatura da lista em anexo, no intuito de convencer esta Nobre Magistrada, que sempre age com justiça e prudência, do bom relacionamento do menor com todos aqueles que o conhecem, verificando-se inclusive que a inspetora e professora da escola onde o mesmo estuda, também firmaram a sua assinatura, bem como os colegas de classe e outras pessoas.

Assim sendo, como trata a internação provisória de medida de exceção cabível em casos extremos, não há no presente fato, razão que a justifique, uma vez que o mesmo é primário e apresenta ótimos antecedentes.

Ainda que se admita a existência de indícios de autoria e materialidade, certo é que a internação provisória não pode se manter diante da ausência do requisito da necessidade imperiosa da medida, o que realmente não se verifica no presente caso.

Pelo que dispõem o ECA e a Constituição Federal, a medida de internação, seja ela provisória ou definitiva, é regida pelo princípio da excepcionalidade. Não deve, pois, ser decretada senão em situações extremas, quando efetivamente a entrega do jovem a seus responsáveis, com altíssima probabilidade poderá inviabilizar a instrução do feito ou a aplicação de eventual medida, o que jamais poderá ocorrer no caso em análise, em decorrência do ótimo antecedente social do menor. Nestes sentido, aliás, já se decidiu:

A internação, ainda que provisória, deve atender os requistos previstos nos arts. 122/124 do ECA. O parágraro 2o. do do art. 122 determina taxativamente que em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada.” (TJSP - AI 13.100 - 0 - rel. Marino Falcão)

Constatando universalmente o dano gerado pelo encarceramento, ainda que não prolongado, no desenvolvimento psicológico do adolescente ainda presumido inocente, a normativa internacional, através da Convenção Internacional dos Direitos das Crianças (incorporada ao Direito interno por Decreto Legislativo do Senado Federal) por meio das regras mínimas que a regulamentou, assim prescreveu:

Regras mínimas das Nações Unidas para a administração da Infância e da Juventude - Regras de Beijing
art. 13.1 - Só se aplicará prisão preventiva como último recurso e pelo menor prazo possível.
art. 13.2 - Sempre que possível, a prisão preventiva será substituída por medidas alternativas, com a estrita supervisão, custódia intensiva ou colocação junto a uma família ou em lar ou instituição educacional.

Regras mínimas das Nações Unidas para a proteção dos jovens privados de liberdade
art. 17. - Na medida do possível, deverá ser evitada, e limitada a circunstâncias excepcionais, a detenção antes da celebração do julgamento.

Sob tal ótica, é evidente que, no caso concreto, não justifica a segregação cautelar do adolescente XXXXXXXXXXXXXXX.

Saliente-se, em primeiro lugar, as circunstâncias da infração, vez que a arma utilizada era de brinquedo, não colocando em nenhuma oportunidade em risco a integridade física da vítima e que não foi o jovem que comandou o roubo e nem estava portando tal instrumento, não havendo em nenhum momento emprego de violência.

Outro fato de relevantíssima importância é a primariedade. Até hoje o jovem nunca se envolveu em qualquer transgressão. Não revela, pois, “periculosidade”, que identifica na infração seu meio de expressão típico. Trata-se, pelo contrário, de adolescente em fase de amadurecimento, ainda por demais sensível às pressões do grupo e que agiu - se assim o fez - por necessidade de se afirmar, por influência dos demais adolescentes. A psicologia dos grupos, especialmente os de adolescentes, explica facilmente a transgressão praticada, inserindo-a num contexto particular de pressão.

Trata-se, em tese, de infrator ocasional, que transgrediu por força da ocasião peculiarísma. Não se deve cogitar, portanto, de existência de dano à ordem pública em sua desinternação. A chance de tornar a infracionar, pois, pelo que revela seu passado, é muito menos provável do que o contrário, já que contando com quase 18 anos de idade, nunca se envolvera em nenhum delito.

Além do mais, como tem se entendido, a custódia cautelar decretada para salvaguarda da ordem pública tem caráter inconstitucional, uma vez que supõe, contra a garantia sagrada da presunção de inocência, ter de fato o cidadão processado contribuído para o ilícito que se apura.

De outro lado, a garantia de que o jovem não colocará obstáculos à instrução do feito, ou ao cumprimento de eventual medida aplicada, advém do fato de contar com família estruturada, residindo na companhia do pai e irmã. O responsável tem controle sobre o rapaz e assume total responsabilidade de apresentá-lo em Juízo quando oportuno. O menor, aliás, não tem qualquer autonomia, ou vivência independente, que sugira possibilidade de abandonar o lar e o distrito da culpa. Vislumbra-se, ademais, forte possibilidade de, ao final, reconhecida eventualmente sua responsabilidade, vir o jovem a ser agraciado com medida em meio aberto, tornando desnecessária sua custódia com o fito de garantir a aplicação da lei.

Ao que parece, pois, a internação provisória vem toda ela amparada numa só circunstância: a suposta gravidade objetiva do ato infracional. Todavia, na órbita da infância e juventude, a gravidade do ato infracional não comanda a definição das medidas mais adequadas, é apenas pressuposto de aplicação para algumas delas. Aqui, a ênfase é na pessoa do infrator, acerca da qual pouco diz uma isolada a ação transgressora. Por tal motivo que a jurisprudência melhor orientada assim vem decidindo:

“Por isto, de lembrar que a regra é o adolescente apreendido em flagrante, ser entregue aos pais ou responsáveis (art. 174, primeira parte), até porque um dos objetivos do Estatuto é o de realçar a importância da família, fundamental para o aprendizado do adolescente. A exceção é a decretação da internação provisória. No caso sub judice só que se tem é a gravidade do ato infracional e indícios de autoria e materialidade, o que não basta, como vimos, para a decretação da internação provisória” (A.I. 31.228-0/2 - Câmara Especial do TJSP).

“Como medida de excepcional, de caráter provisória e preventiva, exige-se, para sua decretação, criteriosa fundamentação acerca de sua necessidade, tomando-se por base indícios suficientes de autoria e materialidade do ato infracional (art. 108, parágrafo único do ECA)” (A .I. 35.483.0/4 - Câmara Especial do TJSP).

“No caso sub judice só o que se tem é a gravidade do ato infracional e indícios da autoria e materialidade, o que não basta, por si, como vimos, para a decretação da internação provisória. Importante ver que o agravado é primário, não havendo notícias de outros atos infracionais por ele praticados e documentos juntados confirma que ele estuda, está trabalhando em ocupação lícita, não se trata de menor desajustado e conta com apoio da família” (A . I 28.865-0/1 - Câmara Especial do TJSP).

2) DA CONCLUSÃO

Por todos estes motivos a liberação do adolescente há de ser concedida de imediato. A aparência do bom direito advém da falta de demonstração, evidente, dos requisitos necessários à adoção da custódia. À míngua de elementos que justifiquem a excepcionalidade da internação, há que se reconhecer o direito de desinternação. Ademais, o perigo na demora é também inquestionável, pois o prejuízo derivado de um dia de privação de liberdade, onde quer que seja (e em especial na Fundação CASA), gera dano moral irreparável.

Isto posto, requer a revogação da internação provisória do menor XXXXXXXXX, por se tratar de questão que venha a garantir o bem estar do menor.


Nestes termos,
Pede deferimento.


Santo André, 30 de março de 2009.



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Alessandra Zerrenner Varela
OAB/SP nº